Kabbalah e Êxodo, de Z’Ev Ben Shimon Halevi

Cursor_e_499011-MLB20470366548_112015-C_jpg__400×400_Às vezes, o texto de Z’Ev Ben Shimon Halevi beira o virtuosismo interpretativo. O autor consegue tirar grande número de interpretações de pequenos trechos do livro de Shemot/Êxodo. Mesmo que o leitor não consiga pescar todas as referências, é ótimo exemplo do palimpsesto que é a Torah para o povo judaico.

Palimpsesto é o texto escrito sobre outro texto, em pergaminho usado. Os mitos judaicos já eram, à época do exílio na Babilônia, identificados como misturas de mitos regionais. Acher foi excomungado por dizer isso, mas não foi esquecido. Talvez os grandes rabinos soubesse que alguém precisava dizer tal verdade.

Shimon Halevi não chega ao ponto de blasfemar sobre o judaísmo, mas o bom leitor saberá que ele se refere a mitos externos durante boa parte das interpretações apresentadas na obra. O texto desta coluna “A Criação dos Quatro Mundos e suas Inconsistências” segue as ideias de Shimon Halevi sobre a criação dos mundos.

Shbaa.

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Os Judeus e as Palavras, de Amós Oz e Fania Oz-Salzberger

Cursor_e_judeus_palavras_-_Pesquisa_GooglePai e filha seguem a longa tradição do debate transgeracional no judaísmo, buscando entender a relação dos judeus com o texto mesmo antes da escrita da Torah propriamente dita. O texto escrito no judaísmo é importante simbolicamente por ser fixo. Mesmo o judeu iletrado aprendeu a decorar a palavra da Torah, repetindo-a para seus filhos e netos. Essa imutabilidade da palavra escrita contrasta com a tradição do diálogo sobre a interpretação da Lei. Se a palavra é fixa, sua interpretação é viva: carrega não só o significado original, mas seu significado histórico e o significado que precisa ter para a vida do judeu hoje.

O livro se separa em 4 capítulos:

  1. Continuidade
  2. Mulheres vocais
  3. Tempo e atemporalidade
  4. Cada pessoa tem um nome; ou os judeus precisam do judaísmo?

O segundo capítulo traça uma visão não-romântica sobre o papel da mulher no judaísmo. Mulheres do povo e mulheres estudiosas de famílias abastadas. A religião institucionalizada parece ter suprimido a voz feminina (literal e metaforicamente), enquanto a religião do povo parece não ter se importando em fazer calar as mulheres.

Usando o Talmud contra ele mesmo, os sábios talmudistas registraram que “das 10 partes da fala, a mulher ficou com nove”. Poderíamos deduzir que se há um Talmud escrito por homens, há nove que as mulheres nunca tiveram permissão de escrever. É sabedoria demais para se perder assim.

O terceiro capítulo interessa para compreender a relação do judaísmo com o tempo — tempo cronológico, mítico e até mágico. As noções de início e fim dos tempos. A relação entre memória e história.

Um ótimo livro para ver como a palavra hebraica adquiriu função análoga à do código genético na sobrevivência do povo judeu.

Shbaa.

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Cabala Judaica: Indicações 2016

Referências para o iniciante nos estudos da cabala

Judaísmo e cabala. Dois assuntos interligados. A cabala, mesmo para os judeus que não creem em D’us, molda a tradição e o pensamento judaico. E o judaísmo, mesmo para os que operam a cabala apenas como ferramenta mágica, é chave para decifrar os símbolos e a gramática da Criação.

Separei cinco livros sobre judaísmo e cinco livros sobre as raízes da cabala, para construção de um vocabulário operacional útil ao estudo autônomo, independente, questionador da magia por trás do que chamam de cabala judaica. Vou listar os livros neste post e, a cada semana, indico um pouco sobre como ler ou o que procurar em cada uma dessas obras.

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Sukot e Ushpizin, hospitalidade e os antepassados

“Ushpizin” significa convidados ou visitantes em aramaico.

Estamos no final do festa de Sukot, “Tabernáculos”.

A festa de Sukot é uma celebração dos antepassados e dos tempos em que os hebreus vagaram no deserto. Uma vez era uma celebração de extrema importância no ano judaico. Hoje é lembrada, mas pouco ritualizada. Conta-se que, quando Shammai, rabino que viveu entre 50 aEC e 30 EC, soube que sua nora havia lhe dado um neto, destruiu o quarto onde ela e o bebê estavam, deixando apenas a cama intacta. Em seguida, erigiu em torno da cama uma sukah, a tenda debaixo da qual se comemora sukot, para que o neto pudesse participar da celebração de forma apropriada.

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Cabala Judaica #19: A Gramática da Criação

Tem gente que diz estudar magia, cabala especialmente, e não sabe colocar vírgulas em uma frase. Gente que se vangloria de praticar algum exercício mágico diariamente há 10 anos e não sabe que aquele “há” tem “h” e acento agudo.

cabala etz chayim cf. Isaac LuriaEsses dias, em conversa informal com os colegas deste blog sobre indicações de leitura, respondi que minha sugestão de livro para quem quisesse ser um mago cabalista deveria ser uma Gramática. Resolvi me justificar por escrito. Primeiro, porque achei interessante que minha indicação para um estudo judaico dito “de mão direita” tenha sido um livro didático, enquanto a indicação do meu colega “da mão esquerda” foi um livro de Literatura. Segundo, porque entendo que, embora todos nós entendamos que deva haver liberdade e intuição na prática espiritual, isso não significa que não deva também haver regras.

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Cabala Judaica #18: da profecia à exegese

Na narrativa do Talmud sobre uma discussão interminável entre os grandes Hillel e Shammai, D’us precisou interferir diretamente para solucionar a disputa. Nem cem anos mais tarde, em outra disputa insolúvel, agora entre Eliezer e Yehoshua, D’us foi impedido de se pronunciar. A narrativa marca a vitória da interpretação e do diálogo sobre a profecia e imposição religiosa.

A história foi registrada no Talmud como tendo ocorrido ainda no primeiro século da Era Comum e, em tempos de ameaças ao estado laico, vale a leitura.

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O Amor foi uma Invenção

Um cantor e um alaúde. Amor cortês. Amor romântico. Romance. Romantismo.

Dizem que o Amor foi inventado por um poeta anônimo do século XII. Assim mesmo, inventado. Algum cantador com um alaúde debaixo do braço teve uma ideia tão melosa e atraente que se multiplicou feito um câncer. Talvez tenha doído. Dói inventar tamanha mentira.

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As Duas Mãos de Deus

Não há dúvidas de que a evolução de apenas um pequeno princípio da consciência traz também o entendimento de muitos mistérios relacionados aos campos do esoterismo. De uma pequena descoberta interna que fiz, inicio agora um conjunto de textos que irá discutir temas muito mais abrangentes – mas ainda assim tão importantes quanto e muito relacionados a nossa vida material diária. Buscando a união do divino com o material, para que entendamos uma das formas pelas quais o espírito se conecta à matéria, prossigamos.

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Cabala Judaica #17: Malkuth embaixo, Malkuth em cima

Cada autor, cada pesquisador da cabala, cada aluno em suas anotações usa das ferramentas que possui para descrever as esferas da Etz Chayim. Malkuth, talvez seja a menos polêmica das esferas. Malkuth é onde tudo se materializa. Malkuth é onde a energia manifestada nas outras esferas “existe” (no sentido corriqueiro da palavra) ao mesmo tempo. Nas palavras dos grandes cabalistas que chegaram até nós, Malkuth foi usado para descrever outras esferas.

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Mitos e Lendas: O Golem

A literatura acerca da magia cabalística sobrevive renegada à fantasia. Se perguntarmos aos grandes estudantes de cabala de hoje, responderão que cabala é uma forma poética de tratar questões internas, psicológicas, sociais. São os grandes rabinos que ainda discordam.

A nossa tradição de cabala ibero-americana sobrevive repetindo a máxima: “no creo en brujas, pero que las hay, las hay”.

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