
- Andando na rua, um pássaro traz uma mensagem.
- As nuvens te lembram de ovelhas da fazenda da infância, ligas para um amigo com quem não fala há tempos, e ele agora precisa de sua ajuda. Ou companhia para uma conversa.
- Na dúvida de aceitar um trampo novo, tu vês um ônibus com propaganda de curso de pós-graduação. É o caminho que tu queres seguir. Figurativamente e literalmente, afinal é o ônibus que te leva para casa.
- Todos nós já lemos cartas de Tarot.
- Alguns de nós conhecem as Runas.
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Em 1964, Joseph Weizenbaum inventou um dos primeiros robozinhos de batepapo: Eliza, a terapeura digital. Dizem que o autor queria fazer piada com psicólogos georgianos, que apenas repetiriam associações de palavras aos seus pacientes sem se aprofundar nos significados. Eliza foi um sucesso acadêmico no campo da linguagem por um bom tempo.

Tecnicamente chamada de “autômato”, Eliza não era muito mais simples do que suas versões modernas, Siri, Alexa ou Cortana. Através de interface de linhas de comando (a pessoa precisava digitar as palavras, em vez de falar para o computador), Eliza identificava palavras-chave. Sonho, sonhei, triste, tristeza, medo, feliz. Então, respondia frases prontas de acordo com a palavra mais importante da frase anterior de seu interlocutor.
— Eu tive um sonho estranho ontem, Eliza.
— Por favor, conte-me sobre seu sonho.
O sistema tornou-se mais curioso, não pela sua precisão, mas por sua aparência de precisão, que dependia da vontade do interlocutor humano em manter uma conversa coerente. Enquanto o interlocutor se mantivesse respondendo com frases coerentes, Eliza também aparentava estar mantendo uma conversa coerente.
— Eliza, eu quero comer um sonho.
— Por favor, conte-me sobre seu sonho.
— Não.
— Por que toda essa negatividade?
A ilusão de conversa natural é facilmente quebrada. Não existe significado nas frases de Eliza. Ela não entende o mundo, não percebe o mundo. Na prática, Eliza não existe. São linhas de código que respondem como se houvesse ali uma entidade, mas são reações automáticas, mecânicas, previsíveis.

Eliza e o consequente significado de suas frases só passam a “existir” quando o humano a sua frente decide que ela existe.
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- De pé na parada, morrendo de fome, um ônibus passa com uma propaganda de pós-graduação. Vamos almoçar na faculdade?
- Na praça, os pássaros lembram do bichinho de estimação de um vizinho de infância, e tu mandas uma mensagem para aquele amigo, que mal lembra teu nome.
- Sem açúcar, diz a tampinha do refrigerante com uma língua no logotipo.
- A letra G caiu daquele outdoor e está no chão bem a tua frente..
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Muitas coisas não têm sentido na vida, porque nós não estamos dispostos a lhes dar sentido. Dar sentido é uma ação que precisamos fazer de forma ativa. Do contrário, nada tem sentido, nada faz sentido.
Nem este texto.
Shbaa.