Estava pensando em revisar o post sobre magia prática nórdica e o expandir, porém acabei esbarrando em uma discussão interessante de ser trazida a tona. É difícil traduzir “magia” para o nórdico antigo, porém temos a palavra “fjölkyngi” e ela possui muito o que ensinar. A exploraremos e veremos o quanto uma única palavra é capaz de conter.
Quando pesquisamos como os antigos nórdicos diziam “magia”, é mais comum encontrarmos diversas palavras que parecem se referir mais a alguma prática específica (ou mesmo elementos que compõem ritos complexos); porém, há um consenso acadêmico de que “fjölkyngi” seria a palavra que se refere a prática mágica no geral. Dissecando seu significado literal, teríamos algo como “sabedoria profunda” ou “conhecimento profundo”; e isto nos revela muito sobre a relação dos nórdicos com a magia.
Existem nomes de Óðinn que possuem o mesmo prefixo de “fjölkyngi“, como Fjölnir (algo como “Ocultador” ou “Sábio”) e Fjölsviðr (“Muito Sábio”); fica claro que é impossível dissociar a imagem de um sábio com a de um feiticeiro. Porém, precisamos nos atentar que a “profundidade” presente na palavra não se refere a uma simples extensão e domínio de um conhecimento teórico – mas sim de uma interiorização tão grande que este saber se torna instintivo para você.
É muito comum vermos a magia exposta como “método” – a “magia nórdica” seria simplesmente “o método nórdico de fazer magia”. Este é um entendimento muito superficial, especialmente em uma era onde os métodos antigos já se perderam e já houveram tantas rupturas e propostas de “como fazer magia” com simbologia germânica. Seguir uma “receita”, seja ela tradicional ou de um autor contemporâneo, não é o suficiente para dizer que estamos praticando “magia nórdica” – que estamos praticando fjölkyngi. É muito mais sobre a relação criada com a própria magia, do que sobre o método.
Fjölkyngi implica observar as circunstâncias ao redor e compreender de onde afinal elas vieram, e então quais elementos poderiam ser movidos para que reverberem e mudem o fluxo dos acontecimentos. Não é um lugar onde podemos fixar que “tal coisa serve para isso” e toda vez poderá ser aplicada como uma solução, mas onde devemos compreender o que o momento está exigindo. Por isso que a “sabedoria profunda” envolve um estado onde o conhecimento se misturou com a intuição, e que a postura do feiticeiro (o praticante de “fjölkyngi” poderia ser chamado de “fjölkunnigr“) se torna contemplativa.
Essa compreensão do funcionamento da magia se liga totalmente com o conceito de Urðr. É comum vermos definições dizendo que o fjölkunnigr é “alguém que possui poder sobre o Tear”, porém esta visão pode soar simplória quando consideramos o estado de contemplação que é necessário para chegar ao fjölkyngi. Seria mais correto dizer que o fjölkunnigr é “alguém que contempla o Tear”, e por sua observação cuidadosa sabe quais fios puxar, remendar, quais energias fariam os fios vibrarem de forma que gerem ressonância com os outros e se transformem em sinfonia.
Ao adotar um novo paradigma, não se atenham a simplesmente “seguir um novo método”. Busquem toda a compreensão do quê é “fazer magia” dentro dessa cosmovisão, e tornem-a parte de vocês. Para praticar “magia nórdica”, ler livros e aprender sobre runas, métodos reconstrucionistas e rituais é apenas uma faceta pálida – devemos nos focar em contemplar aquilo que é capaz de transformar o que sabemos em intuição para praticar “fjölkyngi”.
Sjáumst bráðlega!
-Ravn
1 comentário
Muito bom os posts, continuem assim