A Água Interior e o Monstro de Três Cabeças

“É preciso dar vazão aos sentimentos!
É preciso dar vazão aos sentimentos!
É preciso dar vazão aos sentimentos!”
Bidê ou Balde, É Preciso Dar Vazão aos Sentimentos

Li por aí a expressão “Água interior” e achei que se encaixa bem aqui. Água é o mundo emocional. O que sentimos ou, antes, o movimento interno causado pelos estímulos recebidos pela superfície/interface dos nossos sentidos: tato, olfato, paladar…

Como usar?

Cada esfera das nossas emoções (ou emoções das nossas esferas?) possui um alarme interno. Um contador que se vive apitando, mais baixo ou mais alto, como o contador Geiger. Muitos de nós tentam ignorá-lo a ponto de termos dores de cabeça, enjoos, palpitações. Mas esses são

Pense em uma bússola. Enquanto a agulha sofre as ações do magnetismo, ela não diz à pessoa que move a bússola para onde ir. Ela apenas indica o norte magnético. “Medo” não significa que devemos fugir, significa que detectamos perigo em certa situação. O “prazer” não diz que devemos buscar o que o gerou de novo e de novo e de novo. É um indício de que o corpo fez o que o corpo foi feito para fazer.

Na mesma alegoria, quanto mais precisa a bússola, melhor vai se movimentar a pessoa.

Na cartografia judaica, os sentimentos associados às esferas da vida são: Shiflut, Emet, Temimut, Rachamim, Yirah, Ahavah, (Yichud,) Simchah, Bitul, Ratzon/Taanug/Emunah.

Quando receberam esses nomes, na língua hebraica, cada sentimento possuía propriedades específicas.

Shiflut: Humildade (pequenez, baixeza) Humildade no modo de agir, mas, mais do que isso, sentimento da limitação, erro ou “pecado” de forma libertadora. Uma atriz perguntou para o diretor como ela poderia “se soltar” durante a peça, uma vez que a mãe dela estaria de noite assistindo, deixando ela com vergonha. “Tu não estarias aqui”, disse o diretor, “se tua mãe também não tivesse ‘se soltado’ um dia”.

Emet: Verdade Aqui não é exatamente um sentimento, mas a Verdade é um impulso. Tanto o impulso sexual quanto o impulso de amar alguém é esta Verdade. Antes da razão, é o movimento que torna algo real enquanto for real.

Temimut: Completude Completude se refere a estar presente por completo em uma determinada situação.

Bitachom: Confiança Lembrando que o judeu agradece antes de receber. Porque está confiante no recebimento do que lhe é necessário para a vida.

Rachamim: Compaixão Difícil de traduzir. É sempre apresentada como o equilíbrio entre dar e restringir, entre ahavah e yirah.

Yirah: Medo (ou Ira) É a sensação de se deparar com algo que é muito maior que nós mesmo. Ao mesmo tempo, enxergar nossa pequenez e não se submeter a ela.

Ahavah: Amor Sensação de constante crescimento, vontade de abraçar mais e mais, de ampliar nossos círculos de influência, de compartilhar o que temos em excesso, de criar mais para poder compartilhar mais.

(Yichud,): Unificação A esfera aqui é da’at, que se traduz como “conhecimento” e como “penetração”. Quando Adão “conheceu” Eva, ele da’at. O sentimento aqui é o de se unificar com o outro. Vale aqui a epifania de Ender’s Game: “No momento em que eu realmente entender o meu inimigo, entendê-lo bem o suficiente para derrotá-lo, então, nesse exato momento, eu também amo ele. Eu acho que é impossível compreender realmente alguém, o que eles querem, o que eles acreditam, e não amá-los da maneira que eles se amam.”

Simchah: Alegria Na verdade, é quase a êxtase. Logo antes de se perder de si mesmo. É associada ao shabat, ao sábado, às grandes festividades anuais, ano nascimento, à maternidade.

Bitul: Auto-anulação (humildade) Este é o outro sentido de “humildade”. Em vez de se sentir pequena, inferior, aqui a pessoa esquece de si mesma. Está associada à expressão “bitul hayesh” que deve ser traduzida algo como “anulação da entidade”. Ocorre quando se perde a noção das linhas que delimitam uma pessoa, um indivíduo. Como nas perguntas da semana passada: “Se eu não for por mim, quem será por mim? E, uma vez que eu sou por mim, que sou eu? E, se não for agora, quando?”

Ratzon/Taanug/Emunah o monstro de três cabeças (vontade, prazer, confiança). Imagine um ser humano que fizesse o que precisa fazer no seu dia-a-dia sentindo vontade de fazer o que faz, prazer em fazer o que faz e confiança de estar fazendo o seu melhor…

O que fazer com essas informações?

Sugestão: mapeamento pessoal. O que me cansa? O que me alegra? De onde eu ganho energia? O que libera minha compaixão? De onde vem minha alegria?

Por outro lado…

Sintam-se livres para discordar do método e sugerir outras formas de exercício. Meu modelo é “viciado”. No judaísmo especificamente, o objetivo da meditação é o hishtavut. Traduz-se normalmente por “equanimidade”. O judaísmo entende que:

  • É preciso ter por igual aquele que lhe faz o bem e aquele que lhe faz o mal. Se não tem nenhum sentimento ruim contra aquele que lhe faz o mal, mas tem sentimentos bons por aquele que lhe trata bem, não é hishtavut.
  • Hishtavut é condição para o deveikut (aderir, agarrar-se a D’us).

Sbhaa.

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