Há aqueles que acreditam que tudo está determinado.
E há aqueles que acreditam que tudo depende de nós.
Entre ambos, normalmente surge um sentimento violento e incômodo.
Aqueles que acreditam que tudo está determinado têm a lógica ao seu lado, pois falam da causalidade.
Já aqueles que acreditam que tudo depende de nós, evocam que a causalidade depende de nossas ações, de nossas escolhas.
Eu digo que ambas as coisas são a mesma, e que esse sentimento incômodo de paradoxo é nada mais que uma percepção limitada da realidade.
Aprofundemos.
Quando falamos do Universo.
O mundo ao nosso redor. Uma premissa hipotética a respeito dele (não teoria, nem fato nem verdade, pois não pode ser falseada nem testada cientificamente de nenhuma maneira, dada sua própria natureza) é a de que há Leis Absolutas, chamadas Leis Naturais, que o regem. Há, por exemplo, a Lei da Gravidade. Há as Leis da Termodinâmica, há as Leis da Mecânica Quântica. E todas essas Leis possuem sua origem em uma única premissa indispensável a qualquer delas: A matemática.
Contando
Qualquer aspecto qualitativo de algo se torna etéreo e praticamente impossível de ser visualizado ou definido sem um aspecto quantitativo envolvido. Isso é o campo de atuação da filosofia. Se eu digo que maçãs são gostosas, por exemplo, alguém poderá me dizer que isso é uma percepção meramente minha, que não há necessária correlação, pois a fonte do “gosto” da maçã pode reagir diferente à individualidade de outra pessoa. Assim, é impossível determinar as maçãs como “gostosas”, pois sua natureza é subjetiva ao Observador.
Por outro lado, existe um campo onde a Determinação se torna possível. Esse é o campo das características quantitativas, da matemática. Quando eu digo que há uma maçã na cesta de frutas, alguém pode ir até lá e contar o número de maçãs. Dadas as condições perceptivas iguais (isso é, se a pessoa possuir os mesmos instrumentos de medição que eu, além da mesma linguagem matemática, isso é, o sistema decimal), será possível a ela comprovar que, realmente, há, ali uma maçã.
Da mesma forma, a característica da maçã ser “gostosa” pode até ser emulada caso entremos no campo da neurologia, por exemplo, mudando as conexões e redes neurais de alguém para que essa pessoa tenha a mesma percepção da maçã que outra pessoa. Mas, intrinsecamente, se a característica de algo ser “gostoso” depende de uma certa Ordem das Coisas, isso é, de certas estruturas neuronais estarem presentes em certos locais, então a maçã novamente cai no mesmo problema de antes – ela não é gostosa por natureza, mas sim porque uma determinada Ordem de Elementos, Quantitativos, associa o elemento subjetivo “gostosa” ao elemento objetivo “uma maçã”.
Assim fica definida a diferença entre o Qualitativo e o Quantitativo, e também a capacidade complementar de ambos. E é daí que, da filosofia, das hipóteses, e, por que não, da imaginação, passamos à experiência, à argumentação, à factologia, à ordem, à matemática e, é claro, à ciência. E é na ciência que falaremos da existência das Leis Naturais do nosso universo – e também de seu inevitável estado de Determinação perante a existência dessas Leis.
A Matemática e as Hipóteses
Não vamos adicionar nenhuma conta aqui. Sem números. Apenas raciocínio básico. Sempre que repetimos um determinado experimento, como o de Galileu, que mediu a aceleração do campo gravitacional da Terra, obtemos o mesmo resultado (ou algo muito próximo), desde que façamos o experimento da mesma forma. Contando com o fato de que seres humanos são falhos e que não conseguimos sempre repetir da mesma forma a mesma coisa, não por motivos abstratos quaisquer, mas por simples falta de poder para termos esse nível de controle sobre a realidade, podemos inferir que, de certa maneira, toda vez que fazemos uma ação seguindo exatamente os mesmos passos feitos por outra pessoa, temos os mesmos resultados. E disso, pressupomos, ou seja, imaginamos, que exista algo que una todos esses experimentos, que exista uma Regra, uma Ordem universal implícita, algo que comande que “sempre que seja feito x, ocorra y”.
Essa é a base da ciência. É a origem de todo o método científico e de todo o pensamento científico. É a base do império computadorizado contemporâneo e também de toda a nossa educação e cultura ocidentais pós-renascimento. A isso chamamos as Leis Naturais do nosso Universo.
Determinismo e Leis Naturais
Porém, isso abre um questionamento. Se há Leis Naturais que regem nosso universo, qual é o nível de ação das mesmas? E, acima de tudo, onde fica a posição de nossa Mente, Pensamentos e Ideias nessa coisa toda? Nossas Ações, Escolhas, o peso e importância delas, onde estão ?!
Para a primeira pergunta, temos algumas respostas. Para a segunda…. bem, depende de se você acha que sua mente e seu cérebro são a mesma coisa ou não, e qual é a origem de seus pensamentos.
Até Onde Agem As Leis Naturais
No plano físico, sabemos que as Leis Naturais, caso acreditemos na Estatística e na Física moderna, parecem agir de forma impecável até que certos limites sejam ultrapassados. Esses limites são:
– Uma quantidade de massa igual a aproximadamente 1.5 vezes a massa do nosso sol (massa).
– Uma velocidade igual ou maior que a da Luz (velocidade).
– Uma temperatura igual ou maior que a do Big Bang (temperatura).
– Uma quantidade de massa menor que aproximadamente 800 átomos (massa).
– Uma temperatura menor que 1º kelvin (temperatura).
Todas essas situações extremas geram estados singulares, onde determinadas Leis parecem parar de funcionar. Com muitíssima massa, há a presença de buracos negros, que criam situações onde Tempo e Espaço se tornam incertos. Com muito pouca, há a presença de Efeitos Quânticos, onde tudo se torna confuso. Com muita velocidade, tempo, espaço e eventualmente até massa e energia se tornam também confusos e incertos, alternando entre estados de partícula ou onda, novamente no campo dos efeitos quânticos. Com muitíssima temperatura, uma literal singularidade, um evento onde as leis nos parecem impossíveis de entender ou simplesmente não ter explicação, ocorre. Já com pouquíssima, entramos ainda outra vez no campo dos efeitos quânticos. Contudo, sabendo que massa se refere a energia e que também velocidade e temperatura são medidas da quantidade de energia em um sistema, podemos reduzir todas essas situações a uma única variável: a presença de energia. Quando há energia demais ou de menos, as Leis Naturais como as entendemos param de funcionar.
O que isso nos diz ?
Nos diz que a aparente Ordem que nós encontramos no Universo só é válida dentro de certos limites referentes à quantidade de Energia presente — e nada mais que isso.
Significa que as Leis Naturais existem? Bem, parece que sim. Dentro de um intervalo de Energia que parte de zero até próximo daquela presente no Big Bang.
Pera, pera, Cadê o Determinismo nessa porra toda ?
Para que estou falando disso tudo se o objetivo era falar de determinismo? É simples.
Se considerarmos que nossas mentes são nossos cérebros, então isso significa que, desde que dentro dos nossos cérebros haja uma quantidade de energia maior que zero e menor que a do Big Bang, tomando como premissa que as Leis Naturais existem, somos seres total e completamente determinados. Quando vamos tomar uma decisão, não somos “nós” que tomamos a decisão. De fato, sequer existe um “nós”. A decisão é meramente o fruto de diversas reações químicas em nossos cérebros, levando a uma escolha. Até mesmo quando sabemos disso e escolhemos nos rebelar contra esse “sistema”, isso também é parte das Leis!
Pois essa nossa rebeldia, esses nossos pensamentos e até mesmo o fato de termos entrado em contato com essas ideias são todos produtos de ação e reação, ocorrendo do princípio do universo até hoje. Nunca houve um “eu” que escolhesse qualquer coisa. Apenas reações ao Big Bang. Você, com tudo que você sente, pensa e é, em seu íntimo, é meramente reação residual desse grande fenômeno. Um conjunto de dominós, cujas peças vieram de outros dominós que foram caindo e montando você. Todos os seus pensamentos, suas escolhas, suas ideias, sua moral e sua individualidade são apenas isso – uma grande reação química.
Com exceção, é claro, da possibilidade de que pequenos Efeitos Quânticos ocorram em algum lugar dentro de você, criando uma pequena região de Caos – que então afeta toda a região ao redor, levemente movendo essas peças de seus lugares de origem. Porém, mesmo isso ainda nos traz um problema.
Nem Caos, nem Ordem podem ser usados para definir a nós mesmos, para nos dar identidade e para suprimir esse sentimento incômodo que deve estar comendo seu estômago por volta de agora. Ao pensarmos em nós mesmos como forças caóticas, não somos “nós” que estamos decidindo nada. É totalmente randômico. É pura sorte. Agimos com base na sorte, e não em “nós”.