Sefirat, SFR, esfera, conta, cálculo, pedra, rolo.
A vida do judeu é uma estrada circular.
Sefirat vem da raiz S-P-R. Dela se originaram as palavras esfera, safira. O sentido se estende para conta, cálculo. Ambos com sentido de pedra e de operações matemáticas. Com S-F-R também se escreve sefer, rolo, especialmente no sentido de pergaminho enrolado, a forma como se guardavam os “livros” de antigamente e, até hoje, é a forma adotada para a Torah nas sinagogas.
O sentido de “contar pedrinhas” sobrevive em mitos muito antigos, alguns até ensinados em colégios hoje em dia. “Como o homem começou a contar?” “Ele pegava uma pedra para cada ovelha. Colocava as pedras em um saco e sabia quantas ovelhas tinha contando as pedras no saco, em vez de contar as ovelhas.” Parece mais trabalhoso do que só contar ovelhas, mas ainda assim é uma explicação aceita. O nome para a “numerologia grega” segue a mesma tradição: isopsefia (igual + pedregulho).
Em hebraico, a palavra para a numerologia é emprestada do grego: gematria. Por que isso, se a numerologia da língua hebraica é a primeira coisa que as pessoas pensam quando leem sobre misticismo judaico? Porque não há necessidade de um termo específico para a contagem do valor das palavras em hebraico.
Não existe, de fato, distinção entre número e letra. O símbolo é sempre número e é letra. Não existe o númeral 2. Existe o símbolo beth, que é uma letra com som de B e de V, e um numeral de valor 2. Ou seja, na prática, chai não é transformado em 18 através de uma numerologia. Os dois símbolos de chai são, também, lidos 8 e 10.
Mas tudo isso é útil apenas quando leva a uma interpretação maior e mais prática. Mais do que os possíveis sentidos de se contar dias e pedrinhas e qualidades que não temos, a contagem do ômer é um tempo de reflexão. É tempo de lembrar que o mundo do judeu é um mundo circular. Circular como o calendário. Circular como o dia. Circular como a rotina.
O mundo do judeu é feito de uma estrada de pedrinhas circulares. Algumas brilhantes, outras opacas. Algumas mais redondas que as outras.
Algumas dessas pedrinhas nós juntamos e levamos conosco. Outras nós deixamos cair, e ficam pelo caminho.
Nós nunca chegamos ao fim dessa estrada.
O melhor que a gente consegue é se dar conta de que as pedrinhas que nós colhemos fomos nós mesmos que deixamos cair ciclos atrás.
E, depois, nos damos conta de que o caminho circular em que andamos, e que era todo o nosso mundo, é, na verdade, um caminho em volta de uma mesma pedra, em outro caminho maior.
A alegoria da coleta de pedras se relaciona com o propósito do ser humano segundo o judaísmo: tikun. Os recipientes que continham a luz original eram imperfeitos (ou frágeis) e se estilhaçaram. Cabe ao ser humano reunir os pedaços.
A função da Contagem é restabelecer a união entre os vários aspectos do ser humano, unificar o propósito das diversas energias, estados mentais, sensações, intenções que percorrem a vida em toda sua amplitude. Porque a misericórdia é frágil se não está a serviço da força e da justiça, a vitória é vã quando não se submete à restrição da forma e à paciência, a humildade sem nobreza é só vergonha, enquanto a confiança sem temor é arrogância.
Shlomo ben Avraham Avinu